Economia

  • Manuel Vicente – Baptista Muhongo Sumbe – José Pedro Benge e Fernando Osvaldo dos Santos continuam em liberdade mesmo tendo sido condenados por suborno na Suíça

    Os cidadãos angolanos Manuel Vicente, Baptista Muhongo Sumbe, José Pedro Benge e Fernando Osvaldo dos Santos continuam em liberdade, mesmo após uma condenação do Tribunal da Suíça, em agosto de 2005 e 2006, por envolvimento num escândalo internacional de corrupção envolvendo subornos a funcionários da Sonangol.

    Segundo documentos judiciais a que tivemos acesso, o antigo presidente da empresa holandesa SBM Offshore, Didier Keller, e outros executivos da companhia, foram condenados com pena suspensa por pagamentos ilícitos realizados entre 2005 e 2008. Os subornos, no valor de 6,8 milhões de dólares norte-americanos, foram feitos à empresa panamenha Mardrill Inc, controlada por antigos altos funcionários da Sonangol e um sobrinho de Manuel Vicente, então PCA da petrolífera estatal.

    Quem são os visados angolanos?

    • BAPTISTA MUHONGO SUMBE: antigo presidente da Sonangol Holdings e figura de confiança de Manuel Vicente. Documentos revelam que era o principal nome apontado por Vicente para o substituir na liderança da Sonangol E.P., intenção travada por José Eduardo dos Santos, que nomeou Francisco Lemos Maria. Sumbe aparece como presidente da Mardrill Inc., empresa usada para canalizar os subornos da SBM Offshore.
    • JOSÉ PEDRO BENGE: ex-diretor do gabinete de Manuel Vicente e antigo administrador da Sonagás. É sócio de Domingos Manuel Inglês na empresa INOVIA, envolvida no escândalo de pagamentos a Edeltrudes Costa, conforme reportado pela TV portuguesa SIC. Benge é citado nos autos como vice-presidente e tesoureiro da Mardrill Inc.
    • FERNANDO OSVALDO DOS SANTOS: administrador do Grupo Vernon, braço empresarial de Manuel Vicente e Batista Sumbe. Apontado como sobrinho de Vicente, foi bolseiro da Sonangol e aparece ligado a seis empresas offshore referidas nas Bahamas Leaks. Nos autos suíços, é descrito como diretor da Mardrill Inc., tendo ajudado a operar o esquema de recebimento de subornos.

    O esquema e os ganhos ilegais

    A SBM Offshore N.V., multinacional holandesa especializada em engenharia para o sector petrolífero, é parceira da Sonangol Holding no consórcio PAENAL – Estaleiro Naval de Porto Amboim, onde a Sonangol detém 10% e a SBM, 90%. Baptista Sumbe chegou a ocupar um cargo de administrador na PAENAL.

    No âmbito desta parceria, a Sonangol terá desembolsado cerca de 300 milhões de dólares para obras de acabamento numa plataforma flutuante (FPSO) que já havia chegado pronta ao país. Ou seja, o pagamento foi feito por uma obra que nunca existiu, indiciando fortes suspeitas de corrupção e má gestão de fundos públicos.

    Nos tribunais internacionais, a SBM Offshore assumiu ter pago subornos para garantir vantagens ilícitas em negócios com estatais petrolíferas em cinco países: Brasil, Angola, Guiné Equatorial, Cazaquistão e Iraque. Os ganhos ilegais da SBM com esses projectos ultrapassam os 2,8 mil milhões de dólares.

    Impunidade em Angola

    Apesar da condenação na Suíça e do reconhecimento do esquema pela própria SBM, as autoridades angolanas, sobretudo a Procuradoria-Geral da República (PGR), não se pronunciaram até o momento sobre a possibilidade de abertura de investigações internas contra os cidadãos visados.

    O escândalo foi inicialmente denunciado em 2012 por Jonathan Taylor, ex-vice-diretor jurídico da SBM, que virou whistleblower após ser afastado por pressionar por uma investigação séria. Taylor forneceu documentos e testemunhos às autoridades da Holanda e dos EUA, que mais tarde levaram à condenação da SBM e seus executivos, com pagamento de uma multa de 238 milhões de dólares por violação da Lei de Práticas de Corrupção no Exterior (FCPA) dos Estados Unidos.

    Recorda-se que três organizações não-governamentais (ONG) angolanas apresentaram uma queixa na justiça portuguesa, denunciando alegados esquemas de corrupção e branqueamento de capitais, protagonizados por ex-gestores da Sonangol, petrolífera estatal angolana, entre os quais o ex-vice-presidente Manuel Vicente.

    Em conferência de imprensa, representantes das ONG Associação Mãos Livres, Fórum Regional de Desenvolvimento Universitário (FORDU) e a Associação OMUNGA, ligadas à defesa dos direitos humanos e ao exercício da cidadania, informaram que a queixa foi apresentada junto do Departamento Central de Investigação Penal (DCIAP) português.

    Segundo Salvador Freire, da Mãos Livres, porta-voz do grupo, os factos ocorreram entre 2005 e 2012 e além dos ex-quadros diretivos da Sonangol está envolvido o Banco Millenium BCP (Banco Comercial Português S.A.).

    Perfil de Fernando dos Santos

    Fernando Osvaldo dos Santos, nascido em 1971, é economista com formação pela Universidade de Manchester (Reino Unido) e especialização no sector petrolífero. Em 2000, ajudou a fundar o Grupo Vernon, onde hoje é presidente do Conselho de Administração. A empresa está envolvida em vários negócios com a Sonangol e aparece como beneficiária indirecta de vários esquemas investigados internacionalmente.

    Fonte: O Decreto

Sociedade

  • Cartório Notarial do Kilamba Kiaxi ajudou empresário chinês a falsificar certidão comercial de uma empresa com sede no Soyo

    O Cartório Notarial da Loja dos Registos e Notariado do Kilamba Kiaxi, em Luanda, está no epicentro de mais um escândalo de alegada corrupção envolvendo instituições do Estado angolano ligadas à justiça. Em causa está a suposta falsificação de uma escritura pública, que veio a resultar numa certidão comercial falsa, usada pelo cidadão e empresário chinês Zhan Yongqiao — descrito como uma entidade “influente”, “poderosa” e “intocável” em Angola.

    O caso — envolvendo a empresa de direito angolano I.M.I. Ilundo, Lda (SU), sociedade comercial unipessoal por quotas, com sede no município do Soyo, província do Zaire —, remonta ao ano de 2021, mas só agora passou a ser objecto de uma queixa-crime junto do Serviço de Investigação Criminal (SIC) afecto ao Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional.

    A I.M.I. Ilundo, (SU) Lda, participante do processo-crime, tem como objecto social a prestação de serviço, incluindo a exploração de pescas, e foi nessa qualidade que, em Maio de 2020, o seu representante legal, o cidadão e empresário chinês Yongfeng Gao, acordou em firmar com Zhan Yongqiao, sócio-gerente da empresa Tian Yi He-Pescas, Lda., uma parceria de negócio, com vista à implementação de um projecto de pesca e outros.

    O acordo previa que a I.M.I. Ilundo, (SU) Lda disponibilizasse as suas “infra-estruturas já existentes” ao serviço do projecto e Zhan Yongqiao, através da empresa Tian Yi He-Pescas, Lda., entrasse com um capital de USD 10.000.000,00 (Dez milhões de dólares norte-americanos).

    Acreditando na idoneidade do ‘intocável’ e ‘poderoso’ Zhan Yongqiao, o empresário Yongfeng Gao elaborou, em nome da I.M.I. Ilundo, Lda (SU),  uma acta, datada de 7 de Julho de 2021, com o objectivo de dar suporte à referida parceria, através da qual se propunha a passar algumas quotas à empresa Tian Yi He-Pescas, Lda., tão-logo Zhan Yongqiao efectivasse todos os pagamentos.

    O conteúdo da acta previa que a I.M.I Ilundo (SU), Lda., deixaria de ser uma sociedade comercial unipessoal por quotas e passaria à sociedade comercial limitada por quotas, sendo que o sócio Yongfeng Gao reservaria para si 40% do capital e 60% passariam para as mãos do ‘novo sócio’, a empresa Tian Vi He Pescas, Lda.

    No entanto, enquanto não foram pagos os valores que estavam previstos no acordo, a I.M.I. Ilundo, Lda (SU) decidiu reter a referida acta consigo até que o putativo ‘novo sócio’ efectivasse o pagamento do valor acordado, o que, entretanto, acabaria por não acontecer, devido a incumprimentos do acordo e à ausência de um contrato que haveria de tornar efectiva o conteúdo da acta.

    Loja dos Registos de Mbanza Kongo travou tentativa de fraude

    A 19 de Julho de 2021, a I.M.I. Ilundo, (SU) Lda., recebeu uma notificação da Loja dos Registos de Mbanza Kongo a dar-lhe nota de que, no dia 15 de Janeiro de 2021, o cidadão angolano Cláudio Mendes — munido de uma credencial sem número, emitida pelo empresário Zhan Yongqiao — tentou alterar o conteúdo da certidão comercial da empresa.

    De acordo com o ofício da Loja dos Registos de Mbanza Kongo, com o assunto ‘Nota de remessa sobre Empresa I.M.I Ilundo’, a credencial emitida pelo empresário Zhan Yongqiao habilitava Cláudio Mendes a dar entrada, solicitar, registar, levantar e responder a qualquer documento que fosse de interesse da sociedade Tain Yi He – Pescas, Limitada.

    Com base na referida credencial, o mandatário de Zhan Yongqiao tinha a missão de solicitar a transformação da sociedade de I.M.I Ilundo – Comércio Geral e Prestação de Serviços (SU), Limitada, em uma sociedade comercial limitada por quotas.

    No entanto, de acordo com o ofício assinado pelo conservador adjunto Tussamba Nlandu, a Loja dos Registos de Mbanza Kongo recusou praticar o referido acto, alegando ausência do “Certificado de admissibilidade da transformação da Sociedade Unipessoal (SU) para sociedade Limitada por quotas”.

    Ainda segundo aquele órgão, afecto à Direcção Nacional de Identificação, dos Registos e do Notariado, nos termos da Lei, a cópia da Acta n.º 1/2020, apresentada por Cláudio Mendes, devia ter sido assinada pelos dois sócios, que pretendiam transformar a sociedade consoante os acordos, ou seja, teriam de ter sido assinadas por Yongfeng Gao e por Zhan Yongqiao.

    Por último, o despacho da Loja dos Registos de Mbanza Kongo assinala também o facto de, na tentativa do acto, não terem sido apresentados os originais da ‘Escritura e do Estatuto da transformação’, o que levou a que aquele órgão de justiça tivesse decidido pelo indeferimento do mesmo.

    Rota de colisão e fim da parceria

    A tentativa de alteração unilateral e de modo fraudulento da certidão comercial, por parte do empresário Zhan Yongqiao, abriu uma enorme cratera na relação institucional entre as duas empresas, de tal modo que o acordo firmado entre a I.M.I Ilundo (SU), Lda., e a Tian Yi He-Pescas, Lda., acabou no cesto de lixo, pelo menos, para uma das partes apenas.

    Efectivação da fraude em Luanda

    Não satisfeito com a decisão da Loja dos Registos de Mbanza Kongo, o ‘poderoso’ e ‘influente’ empresário Zhan Yongqiao decidiu redirecionar as suas baterias para Luanda, onde, junto do Cartório Notarial da Loja dos Registos e Notariado do Kilamba Kiaxi conseguiu os seus intentos, transformando a empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., numa sociedade comercial limitada por quotas, sem no entanto contar com o concurso do “legítimo representante”, o empresário Yongfeng Gao.

    Como terá feito isso? Os documentos oficiais falam por si e deixam um rasto de enormes zonas cinzentas, como, por exemplo, o facto de o acto, alegadamente praticado no dia 31 de Julho de 2020, pela notária adjunta Joelcy Isabel Jorge Castelo de Carvalho, no Cartório da Loja dos Registos e Notariado do Kilamba Kiaxi, ser anterior à tentativa frustrada em Mbanza Nkongo.

    Dito de outro modo: a certidão comercial alegadamente falsa, segundo os dados ali expressos, foi outorgada a 31 de Julho de 2020. No entanto, a primeira tentativa de alteração e transformação da empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., em sociedade comercial limitada por quotas, em Mbanza kongo, ocorreu a 15 de Janeiro de 2021.

    Ou seja, não fazia muito sentido que se tivesse tentado alterar e transformar o pacto social a 15 de Janeiro de 2021, quando esta já havia ocorrido a 31 de Julho de 2020, data que coincide com o período em que os dois empresários chegam a acordo, mas não prosseguem com o mesmo por incumprimento dos pagamentos acordados, agravado com a tentativa de alteração da sociedade comercial, frustrada pelo Cartório Notarial de Mbanza Kongo.

    Cartório do Kilamba Kiaxi diz que “certidão é autêntica”

    Apesar de todos esses elementos, uma abordagem feita junto do Cartório da Loja dos Registos e Notariado do Kilamba Kiaxi, pelo escritório de advogados da empresa queixosa, revelou um facto no mínimo surpreende e inusitado: no ofício de resposta à empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., aquele órgão da justiça confirma a realização do acto de transformação e aumento do capital da referida sociedade, ocorrida no dia 31 de Julho de 2020.

    De acordo com o ofício, com o número de referência N/REF n.º 19/LRN-NB/2025, assinada pelo notário Daniel Wassuco Calambo, da Loja dos Registos e do Notariado do Kilamba Kiaxi, “…a certidão e a escritura de transformação e aumento de capital consta do Arquivo do Cartório Notarial desta Loja dos Registos do Kilamba Kiaxi, registada sob o Livro n.º 1-U, Folhas 19/2020”.

    O estatuto de ‘poderoso’ e ‘intocável’ de Zhan Yongqiao

    O estatuto ostentado pelo cidadão chinês Zhan Yongqiao é quase, senão mesmo, do domínio público, por conta de alguns actos nos quais andou envolvido. Um desses actos inclusive se tornou viral nas redes sociais, quando revelado pelo portal de notícias Club-K.

    O ano é o de 2023 e o mês é de Dezembro. Zhan Yongqiao chegou a ser interpelado por agentes reguladores de trânsito, no município do Tômbwa, na província do Namibe, quando conduzia uma viatura de marca Toyota, modelo Hilux, em excesso de velocidade.

    Ao ser abordado por agentes reguladores, Zhan Yongqiao apresentou um passe das Forças Armadas Angolanas (FAA), que o dava como consultor do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas Angolanas (CEMGFAA).

    Zhan Yongqiao chegou a ser conduzido até ao SIC local, mas, para “surpresa de todos”, acabou liberado após alguns minutos, sem que lhe tivesse aplicada qualquer medida sancionatória pela infracção cometida.

    Corrupção toma conta de cartórios

    O caso do empresário Zhan Yongqiao e da empresa I.M.I Ilundo (SU), Lda., ocorre pouco menos de um mês após o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Marcy Cláudio Lopes, ter ordenado o encerramento temporário do Cartório Notarial de Viana, na sequência do escândalo de corrupção envolvendo o seu notário titular, Sala Fumuassuca Mário, e a ex-miss Angola Giovana Pinto Leite.

    A antiga rainha da beleza angolana é acusada de ter instruído a advogada Leda Mingas a falsificar 20 escrituras públicas de compra e venda, para se apropriar de 20 apartamentos, localizados no município de Talatona, propriedades das sociedades comerciais Camomila – Sociedade Imobiliária, S.A., Vista Lar – Sociedade Imobiliária, S.A., e Azul Marinho – Sociedade Imobiliária, S.A.

    No dia 26 de Março deste ano, em comunicado de imprensa, o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos informou que, “por determinação do ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, o Cartório Notarial de Viana terá os seus serviços temporariamente suspensos”.

    “Esta decisão foi tomada a título preventivo, em consequência da constatação de indícios de actos de corrupção e outras irregularidades no exercício da função pública, envolvendo alguns funcionários e terceiros”, lê-se no comunicado, no qual se acrescenta:

    “A medida tem como objectivo preservar a integridade do Ministério e assegurar a observância da legalidade dos actos e o respeito pelos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos”.

    Fonte: IstoéNotícia

Opinião