Instituições angolanas “estão reféns do partido no poder”

Bispos da Conferência Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST) consideram que Angola, após 21 anos de paz, “precisa de uma nova Constituição”, por “na prática” as instituições estarem “reféns do partido no poder”.

A Comissão Episcopal de Justiça e Paz da CEAST, numa mensagem para a Jornada Nacional da Reconciliação e Paz 2023, a que a Lusa teve hoje acesso, recorda que o calendário nacional estabeleceu o 04 de abril como feriado nacional para celebrar os acordos de paz que puseram fim a anos de “guerra intestina”.

Com efeito, sublinha o documento divulgado neste domingo, na abertura da jornada que se prolonga até 04 de abril, passaram 21 anos desde que se calaram as armas, “sendo o mais longo período de ausência de guerra” que Angola registou nos seus quase 48 anos de independência.

Para essa “ingente” tarefa de edificação de “uma paz com conteúdo para todos e cada cidadão deste portentoso país”, Angola “necessita de uma nova Constituição de acordo com as exigências da hora presente”.

Para a CEAST, a “prática atual faz com que as instituições do país sejam reféns do partido no poder”, o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA), no poder desde 1975.

“As instituições vão perdendo credibilidade a nível nacional e internacional por causa da corrupção e da impunidade, embora a mídia estatal se esforce em querer mostrar outra imagem de Angola”, referem os bispos na nota.

A mensagem, alusiva à 22ª Jornada Nacional da Reconciliação e Paz, promovida desde 1996 pela Igreja Católica angolana, foi apresentada no domingo, durante uma missa presidida, no Seminário Maior de Luanda, pelo presidente da CEAST, arcebispo José Manuel Imbamba.

“Aprendei a Fazer o Bem e Buscai a Justiça” é o lema das jornadas que, segundo a CEAST, “impelem a buscar o bem e a aprender na escola da Sagrada Escritura, a buscar a justiça em atenção aos mais vulneráveis”.

Nesta jornada da reconciliação, a igreja católica convida “a uma introspeção e reflexão profunda sobre os males” que “afligem: mentalidade feiticista, ódio, intolerância, falta de transparência na gestão da coisa pública, busca incessante do poder a qualquer preço e a instrumentalização dos meios de comunicação públicos”.

A justiça “é como um tesouro que deve ser procurado e desejado”, sustenta.

“É o objetivo da nossa ação pastoral. Praticar a justiça ajuda-nos a aprender a fazer o bem. É saber captar a vontade de Deus, que é o nosso bem”, salienta a mensagem.

Angola assinala em 04 de abril os 21 anos de paz e reconciliação nacional, feriado nacional alusivo à assinatura dos acordos de paz em 2002.

A Comissão Episcopal de Justiça e Paz da CEAST reconhece que ao longo deste período “muitas coisas mudaram em Angola”, enaltece as “conquistas alcançadas”, questionando, no entanto, os benefícios atuais da paz na vida dos cidadãos.

“É verdade que a guerra aberta acabou, mas será que pode afirmar que todos os angolanos e angolanas vivem segundo as exigências da dignidade humana? É verdade que o país, em termos económicos, cresceu nos últimos anos, mas podemos dizer que este crescimento afeta, positivamente, todas as classes sociais do nosso país?”, perguntam os bispos.

“Estas interrogações podem ser respondidas com honestidade por cada um de nós”, apontam ainda.

Os bispos católicos angolanos, nesta mensagem assinada pelo arcebispo Gabriel Mbilingi, presidente da Comissão Episcopal de Justiça e Paz da CEAST, propõe também uma jornada que “busque a cura da degradação e da corrupção que o pecado provocou em nós”.

“Por isso, sugerimos que, em cada lugar, se proporcionem momentos de reflexão e de um verdadeiro exercício para a busca da justiça e do bem”, assinala.

O Dia da Paz e da Reconciliação Nacional “deve despertar em nós a consciência de cidadania e a responsabilidade de nos sentirmos construtores da paz. Acreditamos que, recordar este dia, faz com que cada um se comprometa, a partir do âmbito que lhe corresponde”, acrescenta ainda a mensagem.

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