General Dino e Manuel Vicente seriam “arquitetos” em estrutura de transferências irregulares

Consórcio de investigação alega que rede de bancos teria sido usada para transferir dinheiro para a União Europeia. General Dino e antigo vice-Presidente Manuel Vicente são citados como “arquitetos” do esquema irregular.

O Projeto e Investigação sobre Crime Organizado e Corrupção (OCCRP, na sigla em inglês) publicou que o antigo vice-Presidente angolano Manuel Vicente e o General Leopoldino “Dino” Fragoso do Nascimento participariam num grupo suspeito de transferir irregularmente centenas de milhões de euros para fora de Angola.

A denúncia está no sítio do consórcio de centros de investigação e jornalistas na internet desde a segunda-feira (13.04) com o título “Como as elites angolanas montaram uma rede privada de bancos para transferir as suas riquezas para a União Europeia”.

No seu sítio na internet, a OCCRP alega que o grupo de funcionários do “governo angolano e de altos funcionários bancários” teria transferido o equivalente a pelo menos 296 milhões euros para Portugal e outros países da União Europeia (UE) com “pouca supervisão” e utilizado uma rede de instituições financeiras para viabilizar as transferências.

O Banco Africano de Investimentos (BAI), o Banco de Negócios Internacional (BNI), e o Banco Privado Atlântico (BPA) foram citados como instituições utilizadas pela rede.

“As elites angolanas alargaram os canais de transferência através da criação de sucursais do BNI e do BPA no estrangeiro”, explica a OCCRP, salientando que a maior parte dos fundos seriam originários de Angola. Verificou-se que o equivalente a 235 milhões de euros eram receptados por empresas europeias ligadas a estes funcionários.

Segundo a denúncia, as sucursais estrangeiras desses bancos – duas em Portugal e uma em Cabo Verde – não teriam aplicado procedimentos normais de controlo para o combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo. Os bancos também não teriam investigado os clientes apontados como suspeitos por reguladores internacionais.

Arquitetos do esquema

A denúncia da OCCRP destaca que o antigo vice-Presidente Manuel Vicente e o General Dino “pareciam ser os arquitetos do esquema”. Dino chefiou a comunicação presidencial no governo de José Eduardo dos Santos e é apontado como um dos homens mais ricos de Angola.

Segundo o consórcio, Dino e a presidência angolana não responderam a um pedido de entrevista, e Manuel Vicente não pôde ser contatado para comentar as alegações.

Mais de uma dúzia de funcionários influentes e membros de suas famílias teriam utilizado a estrutura de transferências. O texto descreve que “empresas alegadamente associadas a Isabel dos Santos, a filha do antigo presidente, receberam milhões”, diz o documento.

Grande parte da riqueza desse grupo da elite angolana, segundo a denúncia, estaria ligada à estatal petrolífera Sonangol – fonte de pelo menos 75% das receitas públicas do país. As transferências, no entanto, também teriam sido desviadas de outras fontes públicas, incluindo alegadamente quase 140 milhões de euros em empréstimos do banco central de Angola que nunca foram reembolsados.

300 milhões em fraudes

Segundo a OCCRP, o esquema chegou a ser documentado em 2016 por autoridades reguladoras portuguesas em dois relatórios de auditoria, que não foram tornados públicos. Nos relatórios, a rede utilizada pelo grupo foi descrita como violadora de “dezenas de regulamentos bancários portugueses”.

Os resultados da auditoria que classificou milhões de transferências como suspeitas, conforma denúncia do OCCRP, foram levados ao conhecimento dos funcionários portugueses e da União Europeia, mas a rede financeira estaria em funcionamento até hoje.

“As lideranças portuguesas não foram sensíveis aos danos a longo prazo que o branqueamento deste dinheiro iria causar ao país”, afirmou Ana Gomes, ex-deputada portuguesa no Parlamento Europeu, a OCCRP.

Para além de prejudicar a reputação de Portugal, a rede continua a corromper o país”, acrescentou.

Ana Gomes disse em entrevista à OCCRP que o seu funcionamento exige uma “rede de difusão da corrupção e da evasão fiscal engendrada por muitos advogados, banqueiros, contabilistas, consultores, empresários, funcionários públicos e políticos portugueses”.

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