Vários ativistas na província angolana assumem que têm medo de ser assassinados devido às críticas que fazem ao Governo do Presidente João Lourenço, uma vez que a “liberdade de expressão é diminuta” na região.
A poesia pode ser considerada crime em Angola, comenta o ativista Jaime Gonga, conhecido como “Malafaia”.
O jovem de 35 anos é secretário provincial para a Cultura, Juventude e Desportos do Movimento de Estudantes Angolanos (MEA) no Kwanza Norte e conta que foi detido em finais de julho durante uma cerimónia de entrega de diplomas no liceu. Tudo por causa de um poema com o título “Adeus Man Zé”, em que falava sobre a governação doex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos, e do seu sucessor, João Lourenço.
“O vice administrador achou-se ofendido e ligou para o Serviço de Investigação Criminal. O SIC alega que eu usei palavras ofensivas. Há uma parte do poema em que eu digo: ‘Man Zé, deste lugar a um incompetente e impaciente que não quer a esperança do desenvolvimento para roubar à vontade’. Eles dizem que isto é ofensa”, afirmou.
Rimar com política é crime?
Segundo o delegado municipal do Ministério do Interior em Samba-Cajú, o superintendente-chefe Fernando João Manuel “Alex”, é uma ofensa que pode ser enquadrada no crime de ultraje ao Presidente da República, punido em Angola com multa ou pena de prisão de até três anos.
“O jovem ficou algumas horas detido por ter declamado uma poesia ofensiva. Ele ofendeu o Presidente da República, acusando-o de má-governação, e também ofendeu os administradores.”
O jovem ativista diz que não fez mais do que usar a sua liberdade de expressão, prevista na Constituição da República.
“Fazer ativismo assim é difícil”, desabafa Ricardo Neto. O jovem ativista diz que teme pela sua vida, particularmente depois da morte de um colega de luta, há quase um ano, em circunstâncias ainda por esclarecer.
Tratava-se de Evaristo Pascoal Ngwala, o antigo secretário provincial do Movimento de Estudantes Angolanos no Kwanza Norte.
“Ngwala foi um grande homem, foi o arquiteto do ativismo no Cuanza Norte. Com relação à sua morte, acredito que Ngwala não morreu por uma doença natural, eu acredito que tenha sido mesmo envenenado,” reforçando que “seria bom que houvesse um esclarecimento oficial sobre a morte do Ngwala”.
“Medo de morrer”
Paulino Pimenta, humorista e influenciador digital, também assume ter medo de morrer, devido às críticas que faz à governação no país.
“Eu tenho muito medo de morrer. Eu temo pela minha integridade física, da minha integridade financeira. Mas isso não me impede de defender certas causas, de continuar falando, influenciando pessoas para que a situação mude”, disse.
O humorista revela ainda que a própria família tem sido pressionada.
“Usam a minha família, vão falar com a minha mãe, com a minha mulher e os meus irmãos para [denunciarem] alguma atitude que eu tenha tido”, afirmou.
Lina Lemos diz que também tem sofrido na pele este tipo de perseguição política por causa do ativismo que faz nas redes sociais e nas ruas de Ndalatando.
Sobretudo quando há manifestações e ela participa, Lina Lemos diz que é perseguida.
“Logo que terminei uma manifestação, já fui recebendo chamadas anónimas”, disse.
Polícia nega pressões
Edgar Salvador, porta-voz do comando provincial do Kwanza Norte da polícia nacional aconselha-os a denunciarem qualquer tipo de abuso.
“Eles até já podiam ter apresentado denúncia à polícia. Recomendamos que procedam à denúncia sobre os elementos que assim se procedem”, afirmou.
No entanto, Edgar Salvador rejeita que membros das forças de segurança estejam a perseguir os jovens ativistas.