É o nascimento de um novo ditador

É o nascimento de um novo ditador

É o nascimento de um novo ditador

Nos primeiros dias da sua presidência, João Lourenço (JL) apresentou-se publicamente como um reformador. Questionado se se prestava a ser reformador à maneira de Mikhail Gorbatchov, respondeu dizendo: «Reformador? Vamos trabalhar para isso, mas claro, Gorbachov não, Deng Xiaoping sim».

A referida e outras declarações são extremamente fundamentais à compreensão da agenda política de JL para o seu mandato e, mais do que isto, para a agenda política do seu MPLA para as próximas décadas. Vejamos:

1 – «DENG XIAOPING SIM»: quem foi a figura em referência?

Deng Xiaoping (22 de Agosto de 1904 — 19 de Fevereiro de 1997) foi o Líder Político da República Popular da China entre 1978 e 1992. Nesse período, introduziu diversas medidas que caracterizaram a reforma económica, a «segunda revolução», como ele dizia, responsável pela completa transformação do país.

Foi o responsável da chamada economia de mercado socialista, regime vigente na China moderna. Dito de outro modo, Deng Xiaoping foi a figura que liderou a transformação da China de um país agrário e atrasado numa grande potência económica, científica e tecnológica comunista.

Ou seja, conseguiu reformar a China à medida da agenda do grupo hegemónico personificado no Partido Comunista da China (PCC), pelo que, apesar de uma economia capitalista, a China continuava a ser um Estado comunista, com as suas brutais práticas autoritárias, como foi em Tiananmen, em 1989.

Assim, ao apontar para Deng Xiaoping como exemplo, e tendo em conta os desenvolvimentos ocorridos de 26 de Setembro de 2017 à data actual, João Lourenço deixou evidente o seguinte:

1.1- Sua agenda consiste na reforma de Angola nos planos económico-financeiro, político-administrativo, judicial etc., mas à luz de uma agenda idealizada e concebida à medida do seu projecto individual de manutenção do poder, isto é, reformar Angola e, por tal via, legitimar-se politicamente para presidir ao País por mais do que 10 anos (dois mandatos seguidos, o máximo estabelecido pela Constituição da República).

Deve ser lembrado que Deng Xiaoping dirigiu a República Popular da China por 14 anos, dando depois lugar a Jang Zemin;

1.2 – A governação de reformas visa também ao projecto do poder do MPLA, ou seja, reformar Angola, mas sem pôr em risco a permanência do MPLA no poder.

O partido tóxico que governa desde 11 de Novembro de 1975 pretende manter-se no leme durante décadas.

1.3 – Os primeiros anos – o primeiro mandato – serve para estabelecer as bases de reforma.

Deng Xiaoping usou os anos de 1978 a 1983 para lançar os fundamentos operacionais e as primeiras grandes medidas de reestruturação e modernização da economia chinesa, sempre com a indispensável assessoria de Zhou Enlai. Desde que chegou ao poder, JL tem lançado as bases da reforma que, na sua visão, tirará Angola do marasmo económico-financeiro, social e político em que se encontrava (e ainda se encontra), fruto da gestão altamente danosa feita durante os 38 anos de José Eduardo dos Santos.

Deve ser notado que Mao Tse Tung deixara, à data da sua morte, uma China agrária, atrasada, fechada e traumatizada pelo seu errático Grande Passo em Frente (que dizimou cerca de 300 000 000 de chineses) e sua destrutiva Revolução Cultural (que vitimou cerca de 100 000 000 de chineses).

2 – «GORBACHOV NÃO»: Mikhail Gorbatchov (2 de Março de 1931) foi o oitavo e último líder da União Soviética.

Foi Secretário-Geral do Partido Comunista da União Soviética (PCUS) de 1985 a 1991.

Foi chefe de Estado do país de 1988 a 1991, na posição de Presidente do Presidium do Soviete Supremo de 1988 a 1989, Presidente do Soviete Supremo de 1989 a 1990 e Presidente da União Soviética de 1990 a 1991.

Ideologicamente, sua identificação inicial era com os ideais marxistas-leninistas, tendo-se, entretanto, no início da década de 1990, inclinado à social democracia. Por que será que JL recusou a figura de Mikhail Gorbatchov como exemplo a seguir? As razões são várias, mas analisaremos 3, a saber:

2.1 – Na realidade, apesar do seu compromisso de preservar o Estado soviético e seus ideais socialistas, a perestroika (reestruturação) e a glasnost (transparência, publicidade) revelaram-se processos contrários ao comunismo soviético e mundial;

2.2 – A União Soviética desmoronou em Dezembro de 1991. O Partido Comunista da União Soviética foi extinto e a Guerra Fria acabou. para os partidos e regimes comunistas remanescentes do mundo todo, Gorbatchov é um traidor que fez agenda do Ocidente;

2.3 – A herdeira da União Soviética, a Rússia, ficou mergulhada num imenso caos económico-financeiro, social e político, que até hoje afecta a posição do referido país no concerto dos Estados.

3 – REFORMA DA ESTRATÉGIA DE REGENERAÇÃO ÚTIL:

os cidadãos dos mais diversos estratos sociais, mais do que questionarem as razões de, mais de 2 anos depois, as reformas não terem produzido resultados positivos com repercussão nas condições de vida da população, consideram que o combate à corrupção, o repatriamento de capitais, a reversão da crise económico-financeira e outras promessas eleitorais são uma mentira.

Todavia, a verdade é que, mais do que estar a implementar uma espécie de governação de lançamento das bases de reforma compatível com a agenda de manutenção do projecto de poder do MPLA para as próximas décadas, em que, por ora, atender às necessidades da população não é a variável mais importante da equação política, o Presidente da República está obviamente mais preocupado em salvar o MPLA da hecatombe provocada por mais de 40 anos de má governação.

O risco persiste.

Combater a corrupção e outros males de forma séria, rigorosa, coerente e consequente seria o suicídio (extinção) do MPLA e, como tal, do grupo hegemónico. E, ao contrário de Mikhail Gorbatchov, João Lourenço não deseja de forma alguma sacrificar o MPLA a favor do Povo.

Isto seria autofagia política. Então, como na China comunista de Deng Xiaoping, reforma-se a economia e a estrutura política do País à medida das necessidades e agenda de salvação do Partido-estado (grupo hegemónico). Dito de outro modo: a reforma não visa ao Estado Democrático de Direito, mas visa a um Estado refém do MPLA, democrático, de direito e de bem-estar social no papel, mas ditatorial e arbitrário na prática.

Deve ser notado que, além de o País continuar num profundo marasmo económico-financeiro e num simulacro de combate à corrupção e outros males, algumas aberturas iniciais do Governo de João Lourenço foram revertidas.

A Polícia Nacional voltou à prática de surrar à bruta manifestantes, como aconteceu amiudadas vezes em 2019.

A TPA, o Jornal de Angola, a Rádio Nacional de Angola, bem como órgãos privados detidos por membros do grupo hegemónico voltaram ao jornalismo pravdesco dos anos de chumbo de má memória.

No plano judicial, os tribunais superiores, depois de terem fingido alguma seriedade por pouco tempo, voltaram a funcionar como instrumentos de controlo e bloqueio político.

O caso do PRA-JA (projecto político-partidário de raiz que foi chumbado pelo Tribunal Constitucional por escandalosas razões políticas) é um exemplo que demonstra a falácia da separação de poderes em Angola.

A Comissão Nacional Eleitoral (CNE) continua a ser presidida por um cidadão (caucionado pelo Tribunal Supremo e pala maioria tóxica do MPLA na Assembleia Nacional) que, além de actos de improbidade no passado recente, desempenhou um papel importante na fraude eleitoral de 2017.

Entrementes, a Comissão de Reforma da Justiça e do Direito, criada recentemente pelo Presidente da República, não deve ser encarada ingenuamente, como se os seus únicos fins fossem os declarados no documento criador da referida comissão.

Os fins não declarados são os que devem merecer toda a atenção e tomada de posição por parte da sociedade civil organizada, porquanto, por mais que João Lourenço e seu MPLA digam o contrário, é imperativo do projecto de poder dele e do seu partido que não cumpra apenas 2 mandatos.

Não deve haver dúvidas de que João Lourenço dá sinais claros de estar a forjar-se como um ditador – um ditador com mãos de ferro em luvas em veludo.

Ele e seu MPLA estão a preparar as condições para a fraude eleitoral em 2022, pois, sem fraude, por força do mau desempenho em pouco mais de 2 anos, a derrota dele e do seus MPLA é certa.

 

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