Frente Patriótica Unida faz diagnóstico de desastre social

A oposição diz ser alvo de censura em Angola. Aos jornalistas em Lisboa traça um quadro de atropelos ao Estado de direito, de falta de independência judicial, metade da população na pobreza total e contratações públicas para amigos. Mas também identifica esperança num rumo diferente.

A Frente Patriótica Unida realizou este sábado um encontro com a comunidade angolana em Portugal e, esta segunda-feira, organizou um conferência de imprensa para os jornalistas portugueses. A estrutura diz ser alvo de “completa censura” no seu país, onde iniciativas como esta não tem cobertura da comunicação social pública para a qual também não são nunca convidados. Esta situação estende-se à sociedade civil não alinhada com o regime do MPLA, afirmam.

O objetivo declarado era partilhar uma “radiografia transversal e atualizada do país” face ao “balanço desastroso” dos dois passados desde as últimas eleições.

Para este movimento político, que junta várias forças da oposição, só há Estado de Direito no papel, há jovens presos por delito de opinião e não há independência judicial, com os órgãos a receber ordens do Presidente da República.

Em termos sociais, destacam a existência de uma “gravíssima crise” com cerca de metade da população na “pobreza total”.

No plano económico, dizem que há uma dívida escondida que “não para de crescer” e que o executivo “viola completamente” o seu próprio Orçamento de Estado. Isto é feito através de mecanismos como as “entregas de fundos por deliberação do Presidente da República” que não vão ao Parlamento nem fazem alterar o OE, e que são uma “prática diária, e da “contratação simplificada” em que se entregam “contratos aos amigos” sem concurso público.

Apesar deste quadro de um “regime violento”, a Frente Patriótica Unida acredita que há um “crescimento da consciência pública” dos angolanos que estarão a pedir reformas como reforma constitucional e a revisão da lei eleitoral contra a “partidarização da Comissão Nacional Eleitoral”.

Outro tema sob escrutínio é a questão dos municípios. Num país sem eleições autárquicas, o regime escolheu criar uma nova divisão político-administrativa. O objetivo da “dispersão de autarquias”, que quase duplicam para 325 é, afirma este movimento, “retardar as eleições autárquicas” com o partido do Governo, o MPLA, a projetá-las para 2027 por causa das supostas dificuldades inerentes ao processo. Para além disso, o redesenho do mapa é também tentar reverter as perdas eleitorais registadas nas últimas legislativas.

Uma última questão que escolhem sublinhar é a nova lei de segurança do Estado. Esta criminaliza práticas como o “votou, sentou”, o desafio que a oposição lançou nas últimas eleições em que se apelava aos eleitores para ficarem perto da assembleia de voto para controlar a divulgação das atas eleitorais, obrigaria à denúncia de quem seja dissidente, atacaria organizações da sociedade civil, sendo considerada um “atentado total contra o Estado de Direito”.

Esperança na mudança contra o desespero do regime diz a oposição

Depois desta apresentação, Adalberto Costa Júnior, presidente da UNITA e coordenador da Frente Patriótica Unida, enquadrou o clima político angolano ao que se passa no resto do continente africano onde sopram “ventos de mudança” como na África do Sul e em Moçambique onde o “partido-Estado” está assustado”. Tal como naquele país, também em Angola o partido do poder “já não representa a maioria”.

O dirigente do maior partido da oposição está convencido numa vitória eleitoral nas próximas eleições, sendo que, defende, já nas últimas as eleições teriam sido ganhas nas urnas pela oposição. Do lado do regime encontra “sinais de desespero” e do contrário demonstrações “claríssimas” de esperança como o encontro no sábado passado em Lisboa com uma sala cheia. Mas, adverte igualmente, “o perigo são os golpes constitucionais feitos pelos Governos”.

Uma situação social “dramática”

Filomeno Vieira Lopes, dirigente do Bloco Democrático de Angola, corroborou o diagnóstico feito sobre um “Estado autocrático, sem instituições democráticas credíveis”, onde “não há poder local” democrático e “a palavra final é de uma pessoa”.

A “captura institucional” das entidades eleitorais “não permite alternância”.

A situação social é descrita como “dramática” com o povo a viver numa situação de “grande desespero”, aumentado porque “não acredita nas instituições”. Assim, qualquer mudança “vai carecer de uma grande pressão democrática” porque a vontade nas urnas “não é respeitada”.

Montenegro fez “uma visita à pipi” a Angola

Francisco Viana, um ex-militante do MPLA que é coordenador do Projeto Sociedade Civil/Nova Angola e coordenador adjunto da FPU, centrou a sua intervenção na recente visita do primeiro-ministro português a Luanda.

Esta desagradou à sociedade civil por não se ter encontrado com ela e por se deixar “enredar” por João Lourenço. Isto porque a “surpresa” de 500 milhões de euros que vão ser atribuídos a Angola foi recebida pela resposta do presidente da República de que o dinheiro “já tinha destino” sem qualquer concurso ou consulta a alguém.

O dirigente associativo dirigiu-se diretamente ao primeiro-ministro português para lhe dizer que os angolanos estão a ser “espezinhados” e para o questionar se não acha que têm “os mesmos direitos” do que outros povos relativamente aos quais ele defende a democracia.

Marcelo Rebelo de Sousa também foi interpelado com Viana a dizer que o “Tio Celito” “anda livremente em Angola mas nós não”, exemplificando com a recente proibição de entrega de uma carta ao Tribunal Constitucional.

Angola são pessoas não só negócios

Abel Chivukuvuku, dirigente da PRA-JA/ Servir Angola, também acredita que nas eleições de 2022 a FPU foi o “fenómeno político” e que as venceu. Apesar de as ter perdido depois “na secretaria”. Nas próximas, em 2027, está confiante “seremos governo” contra um poder “impopular”, “antidemocrático”, de “má governação”endémica”.

Recomendou ainda que a partir do exterior “não olhem para Angola apenas como espaço de negócio mas de vivência de seres humanos”.

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