A predominância de indivíduos com ligações ao aparelho de Segurança ultimamente nomeados para altos cargos no governo ou em instituições do Estado do sector da defesa e segurança é interpretada entre analistas da política interna angolana como um “novo prenúncio” de que João Lourenço (JL) está determinado a manter-se no poder para além dos prazos estabelecidos ou, em alternativa, a condicionar o processo da sua substituição.
A par dos seus vínculos ao aparelho de segurança os novos nomeados são identificados como próximos e/ou da confiança de JL e/ou de Fernando Miala (FM), chefe do Serviço de Inteligência e Segurança de Estado (SINSE) e, de facto, coordenador do aparelho de segurança de Estado, do qual fazem também parte o Serviço de Inteligência Externa (SIE) e o Serviço de Inteligência e Segurança Militar (SISM).
Manuel Homem, novo ministro do Interior (antes, governador provincial de Luanda), exerceu altas funções na segurança de Estado, à qual sempre se manteve ligado; Luciano Tânio Jorge Martins da Silva, novo DG do Serviço de Investigação Criminal (SIC), foi DG adjunto do SINFO, antecessor do SINSE; José Coimbra Baptista Júnior, DG do Serviço de Migração e Estrangeiros (SME) era chefe adjunto do SINSE.
As três nomeações foram subentendidamente relacionadas com a “premência” de substituir indivíduos acusados de implicação em actividades ilícitas ou criminais. O facto de a má reputação dos mesmos, em especial do ex-ministro do Interior, ter antecedentes cuja gravidade aparente poderia já ter levado à sua substituição, alimenta conjecturas segundo as quais o carácter pretensamente moralizador implicitamente associado à medida visou revesti-la de um carácter simultaneamente capaz de lhe transmitir normalidade política e dissimular/secundarizar outras motivações.
O reforço do apoio e/ou da lealdade a JL por parte de instituições consideradas sensíveis, apontado como real objectivo das presentes nomeações e de outras, anteriores, é considerado decorrente da necessidade de apurar a sua capacidade de pressão e de influência face a lutas políticas a que os seus planos de poder o vierem a expor, mas também para se acautelar de “imprevistos” causados por eventuais medidas de excepção a que o mesmo objectivo também o poderá vir a obrigar.
Na cadeia de comando das Forças Armadas e no seu corpo de grandes oficiais têm sido registadas mudanças de menor repercussão pública, mas com o mesmo sentido. De forma considerada mais discreta, oficiais do SINSE têm também vindo a ser infiltrados em instituições do Estado e em empresas públicas, em geral a coberto de funções nominais para as quais são formalmente nomeados.
O chamado “trabalho operativo” do aparelho de segurança no estrangeiro (acções de vigilância de adversários) também conheceu uma intensificação. O actual adjunto do CEMGFA, Gen. Jaime Vilinga (JV)é um quadro do SIE, identificado
como muito próximo de FM. A sua nomeação ocorreu num momento em que o mandato do seu antecessor, Gen. Artur Vinama (AV), ainda não havia expirado. Ambos procedem da UNITA, mas distinguindo-se entre si por JV se ter comprometido com o regime, enquanto AV é encarado com reservas em matéria de confiança política.
A última grande mudança na direcção do SIE consistiu na nomeação de Bertino
Matondo (BM)como seu novo DG (AM 1432). É um quadro de segurança com antigas e estreitas ligações a FM, forjadas por uma carreira em muitos aspectos comum. Para o cargo de DG adjunto foi nomeado um quadro feminino do aparelho com especiais ligações a FM.
Os processos de nomeação de indivíduos oriundos do aparelho de segurança, ou como mesmo conotados, são geralmente influenciados por FM, o qual é cada vez mais apontado como o elemento da superestrutura do poder mais próximo de JL.
Considera-se que os laços entre ambos são reflexo de uma estreita relação de interdependência, do interesse de ambos. FM associa-a ao seu futuro e JL a sua segurança num ambiente de contestação interna.
A oposição à pretensão de JL de se manter nos cargos de presidente do MPLA e PR, além dos prazos estabelecidos, não parece ser vista pelo próprio e pelo seu inner-circle como irreversível ou definitiva. Apesar de evidências de constatação comum, entre as quais a sua abrangência e aparente solidez.
Reparte-se pelo próprio partido, MPLA, através de correntes avessas à ideia,
pela oposição agrupada à volta da UNITA e por meios influentes da sociedade civil.
Nas últimas semanas têm sido conhecidos planos do regime de JL delineados como deduzido fim de fazer esmorecer ou de esvaziar a chamada frente de oposição à sua pretensão. A saber:
– Alívio das deficientes condições de vida da população.
– Promoção de uma imagem positiva de JL, em especial no plano interno, como recurso a campanhas organizadas de propaganda, lobbying e influência.
– Maior controlo dos focos de contestação a JL no MPLA, em especial no seu aparelho.
– Divisão e enfraquecimento da oposição aglutinada na UNITA, bem como de organizações da sociedade civil.
– Capitalização pessoal e política de efeitos positivos de alegados “sucessos” da política externa de Angola (a anunciada visita de JOE BIDEN, p ex), bem como de repercussões impressivas do programa de comemorações do 50º aniversário da independência do país.
Informações consistentes indicam que a prioridade actual consiste em fracturar a oposição agrupada na UNITA (FPU) e desmobilizar alas que no próprio MPLA contestam JL e se opõem aos seus planos de poder (AM 1476). Considera-se que ambas estão “imbricadas”.
Adalberto Costa Júnior (ACJ) foi recentemente prevenido da existência de planos para o eliminar – um intento supostamente visto como capaz de desorientar a oposição em geral, devido à vasta popularidade do visado.
As alas que no MPLA e no seu regime contestam JL, fazem-no invocando argumentos com base nos quais consideram aconselhável a sua retirada no termo dos seus mandatos. O seu entendimento é o de que JL não revelou qualidades gerais para os cargos de presidente do MPLA e PR, a isso acrescentando “problemas de carácter” para os quais remetem a origem de tendências de perseguição e vingança actualmente cultivadas. Também consideram imoral
que JL defenda interesses (a sua continuação no poder) que reprovou no seu antecessor.
A forma como procedeu à recente demissão do ex-ministro do Interior, Eugénio
Laborinho, é vista como um novo exemplo da frieza e/ou falta de retidão dos seus
procedimentos no exercício do cargo. Não lhe mandou comunicar previamente a decisão, da qual o próprio teve conhecimento indirecto no estrangeiro, para onde tinha acabado de se ausentar em missão oficial. É corrente que entre ambos existia uma antiga relação de amizade, alargada a interesses patrimoniais comuns.
FM e EL eram crescentemente identificados como rivais na disputa de influências sobre JL, em que demonstraram capacidade superior à de outros indivíduos do círculo restrito do PR (AM 1423)
Fonte: AM