Os líderes da Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) e da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA) criticaram hoje a “farsa eleitoral” que deu a vitória ao Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) em agosto.
“Não precisamos de ir longe, basta olhar para Angola, onde a UNITA venceu e convenceu, mas não está a governar, como consequência dessa farsa eleitoral”, disse Ossufo Momade, líder da Renamo, durante a sua intervenção numa conferência sobre a democracia em África, que decorre hoje em Lisboa.
O líder da oposição em Moçambique intervinha na conferência “Democracia em África”, promovida pela Internacional Democrática do Centro (IDC), e que decorre hoje em Lisboa, na qual passou em revista as principais dificuldades da implementação democrática nos países africanos, com especial destaque para Angola e para o seu país, no qual considerou que o processo eleitoral está “viciado” pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) desde 1994.
As críticas de Ossufo Momade surgiram poucos minutos depois de o presidente da UNITA ter feito uma intervenção na qual passou em revista as principais dificuldades enfrentadas para garantir eleições justas em Angola.
“Em três anos de liderança da oposição, nunca me deixaram debater com o Presidente João Lourenço, nunca fui entrevistado nos canais públicos de comunicação social, o Tribunal Constitucional anulou, a 10 meses das eleições, o congresso que elegeu o candidato da oposição, que tinha sido feito três anos antes”, exemplificou Adalberto da Costa Júnior na intervenção na conferência sobre a democracia em África, na qual considerou que ganhou as eleições de agosto de 2022.
“Faço daqui um apelo à União Africana, à União Europeia, ao parlamento português e aos Estados Unidos para que não fechem os olhos aos atos inconstitucionais que o partido no poder fez e faz para se manter no poder e perpetuar a pobreza, as dificuldades e as crises que afetam os direitos e a liberdade do povo”, disse o presidente da UNITA.
Entre os vários exemplos de irregularidades eleitorais, Adalberto da Costa Júnior criticou a “conivência” de vários países e instituições, entre as quais o Banco Mundial, que, afirmou, “aprovou programas de financiamento formalmente concebidos para comprar votos”, e disse que há “milhares de angolanos a abandonar o país a seguir às eleições”.
A crítica ao processo eleitoral foi também uma das linhas fortes do discurso do líder da oposição moçambicana: “Em Moçambique, o processo eleitoral está viciado desde 1994, com adulteração do registo eleitoral, eleitores-fantasma, fraco registo eleitoral nas zonas onde as pessoas mais apoiam a oposição, intolerância política, intimidações e assassínios de membros da oposição, académicos, ativistas e jornalistas pelas forças de segurança, tudo para intimidar os eleitores”, disse Ossufo Momade, explicitando que tudo isto é feito “a mando de quem governa o país há mais de 40 anos”.
Na intervenção, o presidente da Renamo, que disputa eleições municipais no final do ano e presidenciais em 2024, disse que em Moçambique “as eleições estão longe de ser livres, justas e transparentes”, mas salientou que mesmo assim foi possível obter algumas vitórias eleitorais.
“Apesar do confronto entre o exército e uma polícia fortemente armada com tanques blindados contra membros da oposição completamente desprotegidos, conseguimos resistir e obter algumas vitórias, elegemos deputados para a Assembleia Nacional, ganhámos alguns municípios e assembleias municipais e somos governo em algumas autarquias; nas últimas municipais de 2018, por exemplo, ganhámos quase metade das 53 autarquias, mas governamos apenas oito”, afirmou.
A situação em Moçambique, onde a Frelimo sempre governou desde a independência, à semelhança do MPLA em Angola, “a situação adulterou-se e está favorável à vitória da oposição”, o que é difícil no atual contexto, disse.
“É arrepiante dizer mas chegou-se ao cúmulo de se enterrarem pessoas vivas, entre as quais as de membros da autoridade, o que é um sinal claro de saturação da população face ao regime”, concluiu o político moçambicano.
O problema, apontou, não é exclusivo de Moçambique ou de Angola, mas sim uma preocupação que atravessa vários países africanos, onde não há uma separação clara entre o partido que governa e o Estado. “O cidadão, por muito qualificado e competente que seja, não consegue ocupar um lugar de destaque na administração pública se não pertencer ao partido que suporta o Governo”, lamentou Ossufo Momade.
Antes, já Adalberto da Costa Júnior tinha utilizado o índice da Economist Intelligence Unit, a unidade de análise económica da revista The Economist, para concluir que “só uma democracia é plena, as Maurícias, havendo seis imperfeitas, entre as quais Cabo Verde, 14 híbridas e 23 países autocráticos, entre os quais está Angola e Moçambique”.
O passado colonial, concluiu, “não explica as dificuldades atuais, mas sim as elites governantes e os golpes constitucionais, como aconteceram em Angola e na Guiné Equatorial”. A reunião que decorre hoje em Lisboa tem como tema “Democracia em África”, e é promovida pela Internacional Democrática do Centro (IDC), que reúne mais de 90 partidos políticos, e decorre na sede da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa (UCCLA).