A Procuradoria-Geral da República já terá remetido ao Tribunal Supremo, para julgamento, um processo em que o reformado general Higino Carneiro é acusado de crime de peculato.
O general Higino Carneiro é acusado de lesar o erário em mais de 100 milhões de dólares.
O pretenso crime de peculato teria sido cometido durante o seu consulado de governador do Kuando Kubango, cargo que exerceu entre 2012 e 2016.
Também conhecido por 4×4 e Buldozer, pseudónimos atribuídos pelo extinto semanário Angolense por desrespeitar regras e limites e não pela suposta “grande capacidade política como negociador do processo de paz angolano”, como fez constar na sua biografia disponível no Wikipédia, enquanto governador do Kuando Kubango, Higino Carneiro adjudicou, sem concurso, empreitadas de largos milhões de dólares à NNN Lda, uma empresa parcialmente detida pelo genro Nuno LaVieter, esposo da sua filha Yolanda Carneiro.
Uma conhecida influencer digital, que alega ter mantido relações íntimas com o general Peito Alto, pseudónimo pelo qual é também conhecido Higino Carneiro, por gostar dessa parte da carne de vaca, gravou recentemente um áudio em que assume ter frequentado resorts e outros empreendimentos luxuosos privados do sogro e genro construídos com dinheiro público em Menongue e arredores.
Higino Carneiro interpretou como autorização para o assalto aos cofres públicos um elogio do falecido Presidente José Eduardo dos Santos a um empreendimento público construído pela NNN, Lda.
À pergunta do ex-Presidente da República sobre a identidade do empreiteiro, Higino Carneiro respondeu rapidamente. “Foi este senhor”, apontando para o ainda então namorado da filha Yolanda.
“Camarada Higino é preciso incentivar esse tipo de empreendedores. Fazer uma obra com essa qualidade aqui no Kuando Kubango é muito louvável”.
A partir daquele elogio, o governador do Kuando Kubango nunca mais recorreu ao instituto do concurso público para a adjudicação de qualquer empreitada pública. Na prática, a NNN, Lda passou a ser a empreiteira oficial do Governo.
Fontes que acompanharam o dossier, garantiram ao Correio Angolense que o elogio do falecido Presidente da República traduziu-se em mais de 100 milhões de dólares para os cofres da NNN, Lda em obras de que ela própria é titular.
Instruído há já bastante tempo pela Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal, o processo contra Higino Carneiro andava a “marinar” numa gaveta do procurador-geral da República, Hélder Pitta Gróz.
Os mais recentes pronunciamentos públicos de Higino Carneiro, em que se insinua como pretendente aos cargos de presidente do MPLA e da República, em pretensa obediência a uma profecia do pai, fizeram soar os alarmes.
A insinuada disponibilidade de Higino Carneiro para aqueles dois cargos é interpretada, no seio do próprio MPLA, como uma afronta ao Presidente João Lourenço, a quem são atribuídas tentações de permanecer no cargo depois de expirado o seu segundo e último mandato.
Ao actual inquilino do palácio da Colina de São José são atribuídos discretas, mas consistentes diligências visando o apoio do seu partido para uma revisão constitucional que lhe permita concorrer a um terceiro mandato presidencial. A tentação de João Lourenço de introduzir emendas na Constituição é apoiada por um conhecido jurista angolano.
Em Maio de 2022, o Tribunal Supremo despronunciou o general Peito Alto num processo em que ia acusado de vários crimes, nomeadamente peculato, nepotismo, tráfico de influências, associação criminosa e branqueamento de capitais.
A despronúncia de Higino Carneiro foi feita pelo presidente da Câmara Criminal do Tribunal Supremo, Modesto Daniel, em suposta obediência a recomendações do presidente da Corte, Joel Leonardo.
Os crimes imputados a Higino teriam sido cometidos entre 2016 e 2017, quando esteve à testa do governo de Luanda.
São consensualmente atribuídas ao Presidente da República as orientações para a despronúncia do general.
Segundo fontes convergentes, Higino Carneiro teria provado, durante a instrução do processo, que desviou dinheiro do Governo de Luanda em benefício da campanha eleitoral de João Lourenço, em 2017.
Além disso, alega-se que João Lourenço deve a Higino Carneiro o regresso de José Eduardo dos Santos com o propósito de participar do VIII congresso do MPLA. Com a presença de José Eduardo dos Santos, João Lourenço pretenderia transmitir aos militantes do MPLA de que ele e o seu antecessor andariam na mesma sintonia.
Supostamente convencido por Higino Carneiro, o antigo Presidente aceitou ir a Luanda, mas rejeitou participar do congresso.
Apesar da recusa de JES de participar do que se pretendia ser congresso da reconciliação, João Lourenço teria reconhecido o papel de Higino Carneiro e, por isso, teria posteriormente instruído o presidente do Supremo a arquivar o processo em que o antigo governador ia acusado dos crimes já referidos.
Depois de se insinuar aos lugares de João Lourenço, é muito improvável que Higino Carneiro venha a ser novamente “ilibado pela falta de provas”, como disse recentemente à LAC a propósito do arquivamento do seu processo relativo ao seu consulado no governo de Luanda.
Depois de Exalgina Gamboa, que responderá pelos crimes de peculato e extorsão por haver transformado o Tribunal de Contas num misto de mealheiro pessoal e agência de viagens familiar, seguir-se-á outro peso pesado do MPLA.
Se o Presidente João Lourenço for consequente, quando chegar ao fim da linha, em 2026, poucos dirigentes de topo do MPLA sobrarão para contar a história aos seus netos.
Para já, não são animadoras as notícias para um pretenso candidato à liderança do MPLA e da República.
Fonte: Correio Angolense