Andrei Belousov substitui Serguei Shoigu como novo ministro da Defesa russo, para acabar com a corrupção no ministério e integrar a guerra na Ucrânia na economia nacional.
Ao fim de mais de dois anos de invasão da Ucrânia, a Rússia anunciou a mudança mais significativa na composição do Governo, com a substituição do ministro da Defesa, Serguei Shoigu, pelo vice-primeiro-ministro, Andrei Belousov. A alteração está a ser interpretada como uma forma de combater a corrupção no Ministério da Defesa, mas também como um sinal firme de que a guerra irá ocupar um lugar cada vez mais central no Kremlin.
A saída de Shoigu, um aliado de longa data de Vladimir Putin que estava no cargo desde 2012, foi vista com alguma surpresa por parte de observadores e até responsáveis próximos do Kremlin. O agora ex-ministro da Defesa manteve-se no cargo durante o período mais difícil para a Rússia desde o início da invasão, no final de 2022, quando as forças russas foram obrigadas a recuar de várias posições por causa dos avanços ucranianos.
A sua saída, anunciada no domingo, coincide, em contrapartida, com um momento de maior iniciativa das forças ao serviço do Kremlin, com a abertura de uma segunda frente de batalha no Norte da Ucrânia nos últimos dias e com progressos no Donbass.
No entanto, a detenção no mês passado do ministro-adjunto da Defesa, Timur Ivanov, braço-direito de Shoigu, por suspeita de corrupção, parece ter deixado o ministro numa situação insustentável. Para afastar a ideia de se tratar de uma punição, Shoigu vai passar a chefiar o Conselho de Segurança, um organismo importante na execução das políticas e estratégia de segurança interna e externa, substituindo Nikolai Patrushev, cujo destino ainda não foi revelado.
“Shoigu está a ser transferido para um cargo poderoso e respeitável por ser leal e porque ele e Putin são amigos”, observa a analista de temas militares russos Dara Massicot, através da rede social X.
A escolha de Belousov para chefiar o Ministério da Defesa foi recebida com alguma surpresa, sobretudo por se tratar de um civil, ao contrário de Shoigu, que fez carreira no Exército. O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, justificou a escolha com a necessidade de “inovação” no ministério e comparou a situação actual vivida na Rússia com a que era vivida nos anos 1980 na União Soviética durante a invasão do Afeganistão, em que uma parte considerável da economia nacional estava dedicada à guerra.
“Aquele que mais estiver aberto a inovações é aquele que será vitorioso no campo de batalha”, disse Peskov.
Na primeira intervenção pública depois de ser conhecida a decisão, Belousov falou sobretudo da necessidade em melhorar as condições de acesso à saúde, habitação e subsídios sociais dos militares. “Penso que é uma confusão quando os participantes na operação militar especial [a invasão da Ucrânia] que regressam em licença são direccionados de instituições médicas civis para hospitais que muitas vezes estão lotados. Esta questão deve ser resolvida”, afirmou durante a audição parlamentar de confirmação da nomeação.
A nomeação de Belousov, um economista de formação também muito próximo de Putin, parece ter um objectivo imediato de conter a corrupção no Ministério da Defesa que, segundo alguns relatos, estaria a desviar amplos recursos do esforço de guerra. “Ele não é de todo corrupto”, diz ao Financial Times uma fonte anónima que conhece Belousov há várias décadas.
“Ele não irá fingir que lidera o Exército como se fosse um general com todas as medalhas. É viciado em trabalho, é um tecnocrata, é muito honesto e Putin conhece-o muito bem”, acrescenta a mesma pessoa.
A entrada de Belousov para dirigir o Ministério da Defesa também poderá dar algumas indicações sobre o rumo futuro da própria guerra na Ucrânia. Desde o início que o Kremlin se tem negado a qualificar o conflito sequer como uma guerra, mas há muito tempo que se especula se haverá necessidade de o Governo colocar a economia nacional ao serviço do esforço bélico.
O orçamento russo para 2024 prevê uma despesa de 6% do PIB com o sector da defesa, o que representa um valor historicamente elevado para o país, ultrapassando os gastos sociais. Essa subida acentuada é interpretada por alguns analistas como um sinal de que o Kremlin se tem estado a preparar para um conflito prolongado ou até mesmo mais amplo no futuro.
A escolha de um economista como Belousov para ministro da Defesa é, possivelmente, mais um sinal de que “o complexo militar industrial é o novo ponto de crescimento económico”, explica ao Moscow Times uma fonte próxima do Ministério da Defesa. “E aqueles que dizem que a operação militar especial está aí para ficar no longo prazo estão correctos.”
Fonte: Público